Estas férias andam estranhas. Regresso a casa e há obras. Obras é uma coisa muito dificil para aguentar em férias. Sou obrigada a ficar em casa, a limpar e a arrumar, queira ou não queira, o que me deixa sempre ligeiramente irritada. E as férias não são para irritações. São para descanso, beleza e liberdade. Isso mesmo.
Nos intervalos das obras, fujo para o sótão e agarro-me às palavras, amigas fiéis. Estão sempre onde deveriam estar e nunca me abandonam. Escorregam pelo lado de dentro e apenas uma infima parte conhece a luz do sol ou melhor dizendo, o espaço do papel que aqui é página digital.
As que aparecem são eventualmente as mais pacíficas e cordatas, politicamente corretas, porque outras há que se embrulham em leitos de pensamentos, como fios de água, num contínuo vai e vem, sem nunca chegarem à foz. Permanecem aprisionadas em correntes de energia suave, dentro do peito, ligeiramente malinas, como dizia o meu sogro, que dava nomes extraordinários às pequenas coisas do dia a dia. Malinas é como ficam algumas palavras que me perseguem ainda que em tom de férias, lenta e pausadamente. Ainda assim não desaparecem e eu a pedir-lhes tréguas. Dizem-me que não há tréguas para quem tanto pensa e ama. Será.
Como não posso vencê-las junto-me a elas e tento dar-lhes um fim. Subo ao sótão, abro o computador e escrevo. As mais dóceis e bem mandadas saem devagar, muito compostas e cheias de uma ligeira discrição. As outras mais profundas e densas, com mau feitio e maus propósitos, enrolam-se umas nas outras, fazem galhofa e pantominices e nada de comporem texto que se veja.
Julgam-se muito espertas, mas eu acho que apenas estão verdes, ainda não amadureceram o suficiente para se apresentarem de corpinho bem feito e com sentido que se veja. Por isso ficam escondidas e outro estatuto não podem ter. Sinto-lhes os protestos, mas não tenho nada a ver com isso. Estou de férias e ainda por cima com obras cá em casa.
Que se organizem, cresçam e apareçam. Como sempre, serão bem vindas. Mais não posso fazer.
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