As nossas pessoas, são nossas, desde sempre. Moram perto e longe, como calha, mas têm lugar cativo no turbilhão dos dias que acontecem. Sempre à mão de semear, cultivam, em boas jornadas, bocados de terra onde germinam as utopias. Conhecem-nos e vigiam-nos, com olhares disfarçados e discretos, porque não são intrusivos nem esfuziantes. As nossas pessoas estão lá, onde precisamos e nem sempre se mostram, porque conhecem a liberdade como principio de relação. Mas respondem sempre à chamada e nunca mordem a corda do nosso fio de prumo.
As nossas pessoas, são nossas, não porque as aprisionamos em nós, em jeito de troféu ou montra, mas porque fundam muito do que aprendemos a amar. Misturam coisas connosco e fazem parte de histórias a que damos vida, que de outra forma não teria sentido. As nossas pessoas conhecem as nossas palavras e propósitos e entendem-lhes o futuro. Por isso velam por nós e às vezes chamamos-lhe anjos, amigos, pais, filhos ou irmãos. As nossas pessoas são do nosso sangue e do nosso coração, por sorte, escolha e condição.
As nossas pessoas dão-nos alento, identidade e certezas. Às vezes, de braço dado com o destino, trocam-nos as voltas e deixam-nos sem pé, bebemos as lágrimas e escondemos a dor da sua partida. Teimosos, recompomos os dias e voltamos a convocá-las para a nossa casa e o nosso tempo. Em fotografias, poemas, saudades, memórias. Porque são as nossas pessoas e fazem absolutamente parte de nós.
A casa
A casa tem a nossa vida
a casa está cheia de nós
de coisas arrumadas e desarrumadas
tapetes sapatos livros
retratos discos
quadros
as naturezas mortas estão todas vivas
alimentam-se de nós
e há móveis que foram de outras casas
e de pessoas que fomos nós antes de nós
a casa tem seus ritos e seus ritmos
canetas de tinta permanente
cadernos e papéis sobre a secretária
madeiras e paredes connosco dentro
a mesa com seus talheres e seus copos
e o nosso pão e o nosso vinho
camas por fazer e camas já vestidas
cadeiras onde nos sentamos
e mesmo sem nós ficam sentadas
a casa com seus passos e seu espaço
de silêncios
a casa com sua fala
a casa com sua alma.
a casa está cheia de nós
de coisas arrumadas e desarrumadas
tapetes sapatos livros
retratos discos
quadros
as naturezas mortas estão todas vivas
alimentam-se de nós
e há móveis que foram de outras casas
e de pessoas que fomos nós antes de nós
a casa tem seus ritos e seus ritmos
canetas de tinta permanente
cadernos e papéis sobre a secretária
madeiras e paredes connosco dentro
a mesa com seus talheres e seus copos
e o nosso pão e o nosso vinho
camas por fazer e camas já vestidas
cadeiras onde nos sentamos
e mesmo sem nós ficam sentadas
a casa com seus passos e seu espaço
de silêncios
a casa com sua fala
a casa com sua alma.
Manuel Alegre "Nada está escrito", 2012