segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Mar por perto

Já chegámos às férias e o mar está à nossa frente. Vigoroso e ameno, uma mistura que consola o corpo e a alma e dá tréguas ao turbilhão do ano de trabalho. O tempo rola lento, ainda que imparável e podemos, sem pressas, alongar os minutos que nos cercam. Estamos livres de compromissos e dispostos à preguiça. Boa.

Imagem relacionadaOlhamos a água azul, o vai e vem do seu movimento, as pequenas conchas espalhadas na areia. Entramos no mar, sentimos o sal na boca e o rosto fresco e molhado. Deitamos-nos na areia, folheamos o livro escolhido, trocamos conversas e risos soltos. Observamos quem nos rodeia, apreciamos-lhes os gestos e adivinhamos pedaços da sua vida, um pouco à deriva, como quem cria um filme ou escreve uma história. Temos tempo que sobra para esta autoria.

E entretanto não descuramos as nossas intenções, de nos cuidarmos por dentro e por fora, mantermos-nos vivos e atentos, saldar pequenas dividas e sobressaltos, redimensionar a infinita alegria de estarmos vivos e incluídos. Celebrar a pertença, como vinculo e raiz. 

E se possível, ser poeta e artesão em ritmo próprio. Construir um castelo junto ao mar, escrever nomes intensos na areia, compor sonetos entre as dunas. Para sentir de que somos feitos e reforçar a inclusão no mundo e no tempo.
Neste verão, para o viver. Seremos capazes?

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

Segurar os filhos pelos calções

Em cima do escadote, a filha alongava o corpo e a energia para colocar o estore na janela. Rodava a cabeça, espreitava para o caixilho, observava o material, acertava estratégias e pontos de vista, discutindo-as com os que por ali estavam. O pai, em justo apoio, pés no chão e olhos ao alto, segurava-a pela presilha dos calções, mostrando, disfarçadamente, o ceticismo com que olhava para o sucesso da iniciativa. Algumas opiniões contrárias, chamadas de atenção técnicas, misturada com a paciência de dar tempo às tentativas e erros. E sem nunca largar a presilha dos calções.

Imagem relacionadaFiquei a vê-los, ela jovem, bonita e assertiva, pouco dada a mandar a tolha ao chão, capaz de teimar e levar a tarefa a bom porto, assim pensa e para isso se esforça. O pai, mestre da arte de pensar e fazer bem as coisas com que se edifica uma casa e uma família. Ali estavam, em acertos que iam e vinham, ligados pelos afetos de uma vida e sem nunca largar a presilha dos calções.

Fiquei a vê-los e a admirar esta relação e esta cumplicidade, trocada em vozes altas, com opiniões e contraditórios, tão ao jeito de quem se escuta, se respeita e se ampara. Discordar e anuir, propor e confrontar, esperar e apoiar. Com tempo para a experiência e o ver para crer, fundamental na aprendizagem e na vida. 

E pensei que é assim que fazemos com os filhos, enquanto crescem e para sempre: deixá-los subir até ao lugar que querem, espreitando os perigos dos escadotes e dos tombos, dando tempo para que experimentem, na primeira pessoa, as circunstâncias e os constrangimentos. Para que possam ser autores dos seus sonhos e senhores da sua vida. Sem nunca largar a presilha dos calções...