Fomos vê-la.
Estava sorridente, apesar de mais
magra e com um pouco mais de rugas. No quarto espaçoso habitavam com ela muitas
fotografias, livros, revistas, uma rosa vermelha, vestidos e sapatos, cremes e
outras coisas femininas. Da sua vida e da sua condição. Apesar da idade,
mantém uma vivacidade positiva que a faz cuidar de si e do ambiente com
zelo e dedicação. Apressou-se a explicar o que tinha como relíquias, quem
estava nas fotos, pai, mãe, filhos, netos, marido, amigas, mostrou-nos os
artigos do jornal onde escreve, desde logo o texto de despedida ao filho que
partiu antes dela, emocionou-se e envelheceu um pouco mais, olhos tristes e
rosto mirrado pela dor, que espantou a seguir, mudando de tema e fazendo graça
com uma coisa de nada que vinha a propósito e ficava bem. Uma espécie de
resignação corajosa, sem apagar a memória, que mantém viva, atual e bem
arrumada por datas, lugares e afetos.
Depois fomos almoçar,
convidaram-nos para o fazer junto dela e assim foi, entre memórias de
juventude, viagens, festas, trabalho, alegrias e desgostos. Tudo com calma,
algumas lágrimas, riso, muita lucidez, simpatia e dignidade. Sem esquecer como
estava e onde estava, sempre a vida a marcar-lhe os dias e as visitas, hoje
nós, amanha outros, ao fim de semana sempre a casa e a companhia da filha, com
a qual teceu a infância e hoje tece a longevidade.
Despedimo-nos. Beijos e abraços,
a promessa de voltar, o nome de uma flor e mulher, Violeta, atenta ao mundo de
hoje, disposta sempre a contar a vida de ontem e a viver a vida de hoje. E assim faz os seus dias, lendo
Agustina Bessa Luís, ouvindo a informação diária, perdendo-se no tanto que
teve, viajou e amou.
E isso a alimenta e isso a faz
resistir. Com um sorriso bonito, uma presença agradável, uma solidão que enxota
e não quer por companhia.
Também não a vi por lá, o quarto está cheio de gente
e de memórias, a casa com muitas histórias e pessoas a morar.
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