domingo, 22 de junho de 2014

Dia de festa

É sábado.
Manhã de rotina, comprar o jornal e beber o café, ler as gordas e respirar. Apreciar o sossego matinal e o silêncio, sobretudo o silêncio, depois de uma semana cheia de ruídos, vozes, choro e risos de meninos e meninas. Como sempre e ainda agora.
Ontem foi dia de muito riso e alegria. Fizemos a festa de final de ano, evento discreto, à dimensão das crianças, que os grandes programas, pomposos e muito ensaiados, não são coisas de pequenos. Mas teve cor, música e danças, gel no cabelo, unhas pintadas de azul, flores no cabelo e na lapela. Assim escolheram os atores principais. Os grandes propuseram uma dança tradicional de roda e um rap. Dançado em muitas variações, com gestos de cu duro e danças ciganas. E até ballet. A diversidade é coisa para manter e coreografar os dias da nossa vida, para dizer ao mundo quem somos e afirmar as nossas origens e identidade(s).

O cenário ficou cheio de trabalhos coletivos, feitos durante o ano, pinturas de outono e primavera, um pano com os direitos das crianças, um quadro com colagem de rostos de crianças, uma pintura grande com as nossas pegadas, muitos traços e manchas e cor, feitos pelas nossas mãos. A divulgação das nossas obras é coisa para mostrar às familias e comunidade, para que a infância possa ser mais amada e respeitada. E entendida.

As familias subiram ao palco, para um abraço mais próximo e a entrega de um diploma a elas dedicado, confirmando que a sua presença é coisa para se alimentar e provocar, em todos os dias do ano. E para aprender e usufruir, que a vida tem que ser contrariada e quem vive na sombra tem direito à luz dos holofotes e a momentos de reconhecimento e afeto. Na escola e fora dela.
Depois lambuzámos a boca e os dedos com bolo de chocolate, torta de laranja, bolachas, gomas. Coisas de festa, doces e sumo a descer pela garganta, que a fome e a sede têm que ser saciadas, depois de uma festa de emoções e alegria.
Ainda houve tempo para pinturas de pais e filhos, avós e netos, tios e sobrinhos, primos e vizinhos, que as familias são diversas e refeitas com o correr do tempo e dos amores, do azar e da sorte, mas continuam a ser o colo onde as crianças dormem desde o dia em que nasceram, ainda que nem todas.

Ontem foi um dia bom. Uma festa curta, mas cheia. Lembro-me das crianças e da sua alegria. E da sua competência para se mostrarem, ligando palavra, dança e riso. Ninguém viu os enganos, a roda pouco redonda, os movimentos ao contrário, a distração a olhar para o publico. Isso foi apenas um infima parte da performance dos meninos e meninas. A outra parte, aquela que nos enfeitiçou, foram os abraços, o brilho dos olhos, as conversas soltas e próximas, as fotos e as flores que foram para a cabeça das familias, a provar que todos podem ser atores do seu tempo e da sua vida.

Hoje bebi o café com mais confiança e sentido de missão cumprida. Por entre as gordas do jornal, ouvia e via os meninos e meninas e a sua alegria, o movimento dos seus corpos e o som da sua voz. Temos que continuar a apostar em tempos de luz, ainda que saibamos que os dias cinzentos irão continuar a existir. Que isso não nos demova, nem nos consuma a energia e a fé nas nossas convicções. Sobretudo aqui.

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