Lembro-me de muitos rostos de mulheres, sobretudo da minha infância, por terras de Aveiro. Guardo-lhes o riso e a resolução, a fibra e a resistência, o canto e a oração. Entre a casa e a rua, serenas ou inquietas, faziam-se aos dias em múltiplas obrigações, alguns prazeres e muitos mistérios. Assim o entendia, quando pelo cair da noite, as via deslizar pela casa, em rezas de proteção e promessas para os seus. Pareciam anjos em forma de gente, com mãos de fadas e coração atento, a compor roupas ou a preparar a sopa para o dia a seguir à madrugada.
Às vezes viravam leoas em dias de guerra velada, quando o destino rompia para malfadar a sua prole, vizinhos incluídos, porque as mulheres da minha infância reinavam em comunidades de porta aberta, com laços de bem querer a outros, que não só os de sangue.
Interpunham-se vigilantes, entre o passado e o futuro, para manter a firmeza e a segurança do presente. Vi-as sempre de candeia acesa, a iluminar os caminhos e a comandar a sorte.
Quando choravam, sentia o meu mundo a tremer, porque me inquietava que perdessem o seu poder de revelar e aperfeiçoar mundos. O tempo mostrou-me que a sua fragilidade andava de braço dado com a coragem e que ambas se suportavam na construção da vida.
Aprendi com elas tudo o que de melhor tenho. Sobretudo a capacidade de amar e a vontade de não desistir.
Aqui fica a minha homenagem.
Adorei o texto sobre estas mulheres "anjos em forma de gente" que "às vezes viravam leoas" sempre prontas a "iluminar os caminhos e a comandar a sorte"
ResponderEliminarLuzia