quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Ser(se) educadora

Fui a Évora falar sobre o meu percurso profissional no contexto da Lincenciatura em Educação Básica. O convite não veio com nenhum guião prévio, a não ser a ideia de apresentar a trajetória profissional de uma educadora de infância, à semelhança de outras já realizadas e a realizar - professora do 1º ciclo, por exemplo - para dar a conhecer esta "coisa" de ser-se educadora ou professora. Lá fui, falei, conversei, li excertos de textos de outros, dei exemplos, convoquei meninos e famílias, momentos criticos, contextos de trabalho, aprendizagens.

Uma hora e meia de muitas palavras, apoiada num roteiro antecipadamente pensado (não com muito tempo, diga-se de passagem) onde as dimensões pessoais se cruzaram com as profissionais, pois como disse, citando António Nóvoa, em cada profissional há uma pessoa e a pessoa é o profissional.  E falei dos diferentes contextos por onde fui sendo educadora, certa de que, como refere Rui Canário, a escola é o lugar onde os professores aprendem. E citei Paulo Freire e a Pedagogia da Autonomia, João dos Santos, Sérgio Niza, Edgar Morin.. e falei do trabalho voluntário e cívico que sempre me acompanhou desde a juventude, de formações realizadas, de outras educadoras que foram e continuam a ser referências fundamentais no meu desenvolvimento profissional. E disse também de gostar de escrever e de me inquietar com a profissão. E falei também de ética e de democracia. Tudo isto numa hora e meia. 34 anos numa hora e meia!

Depois no comboio, de regresso, pensei se teria dito o fundamental. Se teria dado suficiente centralidade à criança, às crianças e às suas famílias, as matérias primas essenciais nesta caminhada de me ter tornado a educadora que sou e ainda virei a ser. 

Se terei salientado, com suficiente convicção e clareza, os enredos da jornada pedagógica, o fluir do quotidiano, a dimensão da sala, dos risos, das conversas, dos desenhos, dos projetos, da aprendizagem, do currículo.

Se terei referido que o instrumento fundamental do trabalho das educadoras é o seu corpo, não só aquele que se vê, uma espécie de território físico que abraça, ampara, contém, liberta, mas também o que está dentro do corpo, na cabeça e no coração e que são sentimentos, ideias, conceções, perspetivas. O Ser, saber e saber fazer, tão banalmente papagueados como domínios da aprendizagem e do ensino, mas tão difíceis de traduzir e alcançar, em coerência. Se terei dito, sem rodeios, que ser educadora é ser isso tudo, em simultâneo. Se frisei o modelo que somos para as crianças e as famílias todos os dias, dos muitos dias da nossa vida profissional e como isso é de uma extrema exigência. Se falei do cansaço, para além do deslumbramento.

E se no meio de tantas palavras, centrada na minha experiência e no caminho feito, terei mostrado a realidade da profissão. Uma parte, claro, porque o mundo é imenso, as formas de viver a profissão também e cada um de nós apenas pode ousar desocultar, com o máximo de verdade, a sua verdade.  
Espero assim ter feito.

6 comentários:

  1. Querida Manuela
    Obrigada pela vinda a Évora "meter o Rossio na Betesga". Desculpa pela ousadia de te pedir para em 1 hora e meia vires falar da tua pessoa/profissional. Sendo quem és, grande e inspiradora, verdadeira e inquieta, encantada com as pessoas e crente na nossa possibilidade de aspirarmos longe, exercendo o dia a dia com a liberdade de um pensamento ético sólido. É demais para tão pouco tempo. Mas, como digo a estas alunas, as aulas servem apenas para incendiar e para depois se irem iluminar, aquecer, e levedar na vida inspiradas por qualquer ideia colhida nessa aula. Tenho a certeza que isso aconteceu e que estas alunas irão saber que existem profissionais assim. E isso é tão importante para quem teima neste tempo em fazer da educação a sua vida.
    Obrigada querida amiga e até sempre.
    Assunção

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  2. Não é nada disso, dizer que 1h30m não chega para me dizer! A questão é saber se o fiz com eficiência, se fui capaz de organizar claremente as ideas e as emoções, claro, que é sempre dificil. E podes convidar-me mais vezes, se for util, aposto que farei de outra forma e é isso é que é bom. A oportunidade de nos pensarmos.
    Obrigada. Eu gostei! Abraços

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  3. Gostava de poder deixar aqui um enorme obrigada. Obrigada por partilhar a sua experiência de vida, o seu percurso como educadora, por partilhar as suas histórias, saberes, por durante 1h30 nos conseguir cativar e por ter despertado em mim ainda mais o interesse pela educação. Após esta pequena "aula", fiquei com vontade de ir para o campo de trabalho, pôr mãos à obra, educar e aprender (com os colegas, com as crianças, com os erros). Desde sempre que me imagino como educadora e sempre me interessou as crianças com necessidades especiais o que me levou a identificar-me tanto com as suas histórias. Falou com sabedoria, mas com muita emoção, o que releva a pessoa que é, a educadora que é. Espero, de futuro, poder aprender mais consigo, porque nesta 1h30 aprendi, e muito.
    Uma frase que disse, e que me marcou especialmente, "o fundamental é educar com emoção", e acho que é isso que todos os educadores e professores deviam ter ciente no dia-a-dia com as crianças, pois não é apenas através das palavras que as crianças aprendem, mas essencialmente através das nossas ações, sendo depois, um exemplo a seguir e isso sim, é "chegar a casa" depois de um dia de trabalho, e pensarmos que conseguimos, "hoje", contribuir para o desenvolvimento de uma criança, que estamos a contribuir e a preparar cada criança para o futuro e para o mundo.
    Mais uma vez, Obrigada!

    Andreia Marques

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  4. Muito obrigada Andreia. Se com o que disse, consegui mobilizá-la para a questão da infância e da profissão, é muito bom e valeu a pena ter ido a Évora. Desejo que continue a lutar e a acreditar no seu desnvolvimento profissional e isso começa logo como estudante.
    Um abraço e sempre que quiser, estarei disponivel.

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  5. Olá Manuela, se me permite tratá-la assim, uma vez que não nos conhecemos, mas somos colegas de profissão,

    Cheguei até aqui através de uma partilha da colega Teresa de Matos no facebook, e não me arrependi de ter entrado no link, pois fiquei a conhecer este espaço, que pretendo acompanhar mais de perto.

    Gostei muito deste seu post, fiquei quase com vontade de ter estado lá e compreendo, pode crer, a sua inquietação com o resultado do seu trabalho... "será que consegui transmitir aquilo que, de facto, é essencial?"

    Penso que, só essa preocupação, é já um bom sinal e tenho a certeza, pelo que aqui li, que todos os que assistiram saíram de lá mais enriquecidos.

    Acredito que quem tem este "bichinho" da educação, consegue fascinar e contagiar os que estão em seu redor.

    Brevemente terei um desafio parecido... ir a um local deste país, que não conheço, convidada por pessoas/profissionais de educação que também não conheço (mas que, de alguma forma, pelo que conhecem do meu trabalho, me consideram apta...) para fazer exatamente o mesmo que fez: falar a uma assembleia sobre educação de infância e sobre a forma como eu a sinto e a vivo, que é a minha forma de ser.

    Espero, tal como a Manuela, após 26 anos de serviço, conseguir estar à altura do desafio.

    Bem-haja,
    Cumprimentos da colega,~
    Maria Jesus Sousa

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  6. E acho que deve ir e partilhar o seu saber e sentir...por aquilo que conheço de si (sim, conheço um pouco do seu trabalho...)será bom ouvi-la. Estou convencida disso.
    Muito obrigada pelo comentário. Neste tempo dificil é bom saber que não estamos sós!
    Abraço

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