Queria convidar-te para te aproximares e te sentares à soleira da porta, como a minha avó fazia quando comigo queria ter uma conversa séria. Séria porque reveladora, assim achava eu, admirando a sua pouca tendência para falsos moralismos e atitudes conservadoras. Falava e eu compreendia, ficando mais sabedora da vida e dos seus mistérios. Ouvir a minha avó era ouvir para além dela, porque ela parecia conter o mundo todo. Assim queria eu que acontecesse comigo. Aceitavas o meu convite e sentavas-te na soleira. Com tempo. E falaríamos de quase todas as coisas que não podem ser ditas, mas que florescem com força, junto de afetos profundos e apoios incondicionais. Dão-se bem em locais e com gente assim.

- Quem, o amor? por favor, é coisa pouca, relativa e passageira. Sei que dirias isto, abanando a cabeça, naquelas verdades de juventude que tudo sabe e pouco acredita. E irias embora, impaciente, pensando de ti para ti que não há solução para a minha teimosia. E eu ficaria na soleira, ainda a sentir as heras, juro, a vê-las a alastrar em muitas direções e a querer chamar-te para te mostrar a minha ideia e convicção. E as heras. E lembrar-me-ia de novo da minha avó e desejaria ter a sua capacidade para conversas a dois, que sendo a dois, envolviam quase multidões. Por isso eram tão especiais.
E ao ver-te partir, teria vontade de te falar de novo do princepezinho e da raposa, do "essencial é invisível aos olhos, só se vê bem com o coração" e "ficas para sempre responsável por aquele que cativaste"...Mas sei que não ouvirias. E contra minha vontade, sei que talvez desistisse.
Também, este é um tempo onde existem poucas soleiras de porta, eu sei, talvez este convite não deva ser feito, ou pelo menos impõe-se a mudança de local. Tomando esta providência, achas que já seríamos capazes de conversar?
Sem comentários:
Enviar um comentário