segunda-feira, 18 de março de 2013

Solidão

É um homem só.
Afaga o cabelo com gestos delicados, quando o vento sopra atrevido, levantando as folhas secas dos caminhos, em coreografias agitadas, ainda que muito belas. Estando só, quer manter-se inteiro, não aceita descompor-se por fora, quando muito está descomposto por dentro e isso basta. Assim, compõe o cabelo vezes sem conta, para que tudo esteja no sitio certo e  o seu rosto surja sereno e indecifrável. E surge.

Sempre que entra em casa, procura a janela e a linha do horizonte, gosta de ver os pássaros em voos rasantes, o pôr do sol e o nascer da lua renovam-lhe a promessa de um recomeço, sabe-se só e não desespera, mas deseja partir pelas madrugadas de um tempo futuro.

Pensativo, percorre quilómetros sem sair de casa, avenidas largas e países novos, oásis de liberdade onde pensa poder ser feliz. E fechado no quarto, inventa amores de causas maiores, acordes perfeitos que ensaia com timidez no quente da solidão.

É um homem só.
Depende se algumas memórias e sonhos por cumprir, acalenta-os em manhas de primavera que ousa desejar e teima em perseguir, sem contar nada a ninguém. Quando o interrogamos responde rápido e com voz baixa, disfarça o tremor que lhe consome a garganta e sorri.

E porque olhamos com olhos de ver e amor ilimitado, confirmamos que é um homem só, com doses suaves de sofrimento e coragem do tamanho do mundo. Assim o amamos e assim o queremos: menos só, mas sempre inteiro e coerente.

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