Hoje é dia da criança.
Quando os meus filhos era pequenos, comprava sempre uma prendinha ou fazíamos um programa para assinalar o dia. Hoje estão grandes, homens feitos e por isso, as crianças cá de casa transformaram-se e já não existem. Agora têm barba, programas próprios e teorias sobre a vida. Em crianças também, expressavam ideias e debatiam-nas, criticavam e argumentavam, propunham e resistiam. Cresciam enquanto pessoas e nós a senti-los filhos, que é uma coisa que às vezes atrapalha as nossas crenças e perspetivas e sobretudo as práticas, o fazer da educação, que desejamos equilibrada, respeitadora de direitos, promotora de deveres, livre, atenta e segura. Julgo que é um pouco a nossa condição de pais, uma luta (pouco) pacifica para acertar com os condimentos e as medidas certas de educar, tarefa que só aprendemos, fazendo. E não há escola, curso ou formação avançada que nos dê um diploma de mãe e pai, adequadamente pronto(s) para a função. Quanto muito, em alguns dias e com alguns amigos, as trocas e desabafos, para sentirmos que não estamos sós e que tudo o que experimentamos enquanto pais, outros também o vivem. Mas estes grupos de tertúlia parental são escassos, porque escassa é a nossa cultura de revelação intima de nós enquanto educadores limitados. E finitos.
Na escola, no jardim de infância, sempre foi mais fácil. Para além do dia da criança, todos os outros dias de currículo, a relação e as estratégias para celebrar e viver no quotidiano a infância, aqui tornada coisa da profissão, tudo mais sereno, um curso tirado, as convições postas à prova, autores lidos, os escritos de João dos Santos como livro de cabeceira, as formações e a aprendizagem em contexto, o desejo de fazer bem e sobretudo não ter carregado na barriga os meninos, essa diferença fundamental que nos torna professores e não pais. Que os torna alunos e não filhos. Uma condição imprescindivel para manter aquela distância emocional justa que nos conduz ou empurra para sermos emocionalmente mais equilibrados, mais competentes, lúcidos e melhores educadores. Sem erros? não, com erros, mas com uma gestão mais equidistante, menos sofrida ou ambivalente. Mais clara. Menos embrulhada no calor de uma gestação de nove meses de sonhos, enjoos e esperas ansiosas e alegres. Totais.
Por isso, compreendo bem os pais e não lanço a primeira pedra, nestas coisas da educação e dos seus múltiplos modos e jeitos de serem família e de exercerem a parentalidade. Compreender é inscrever numa visão alargada a imensa complexidade de ser-se pessoa, é retirar os julgamentos, as penalizações, as leituras breves, as culpas. É compreender as resistências, a fragilidade de vínculos, as expectativas, a proteção exgerada, as omissões, os evitamentos e tantas outras coisas entre educadores e famílias, que tornam esta relação, em muitos momentos, tão difícil e tão pouco cordial, ativa, colaborante e de apoio mutuo. Compreender é colocarmo-nos do ponto de vista do outro e tentar sentir e pensar como ele. E isso, não sendo fácil, é possivel. Compreendo porque sou mãe. Compreendo porque sou família. Compreendo porque sou pessoa. E não somos todos pessoas e familia(s)?
Detenhamo-nos um pouco, hoje, no dia da criança e para além de programas e prendas pensemos nesta gigantesca tarefa de educar que mobiliza, diferentemente, educadores, professores, pais, família alargada, comunidade. Como diz um velho provérbio "é preciso toda uma aldeia para educar uma criança".
Neste dia da criança e nestes tempos dificeis, relembremos que todos somos ainda poucos para educar pessoas felizes, atentas, criticas e atoras do seu tempo e da sua vida. Este é o desafio. Gigante.
Sem comentários:
Enviar um comentário