Estou para aqui meia calada, assim com uma ponta de saudade e nostalgia, a relembrar o que hoje vi e aprendi. Ficaram-me na retina e na memória as imagens das fotografias e uma espécie de cheiro desse tempo. Creio mesmo que sinto as brincadeiras do recreio e o jardim meio selvagem, cheio de esconderijos fantásticos que os arbustos e as ervas "não tratadas", permitiam. Não sabem do que falo? Eu conto.
Em 1978 uma jovem educadora iniciou o seu percurso de trabalho, num jardim de infância em Lisboa. Trazia dentro de si todos os sonhos para fazer educação que é como quem diz, educar e cuidar de crianças, o melhor que pudesse e soubesse. Para isso sabia da importância de fazer caminho em companhia aprendendo com os meninos, as famílias e colegas mais experientes. Aceitou assim o desafio de deixar entrar na sua sala uma Educadora de Infância do Ministério da Educação, que na altura, acompanhava, em jeito de supervisão (não se conhecia o conceito, mas era isso...) os jardins de infância da rede publica. Aceitou o desafio com receio, mas cheia de convicção. Os olhares dos outros, se amigos, ainda que às vezes criticos, como convém, só nos podem ajudar a sermos mais e melhores profissionais.
Passado 35 anos, numa formação sobre portfólios que a educadora frequenta (já não é jovem, entenda-se, mas ainda acredita na necessidade de uma continua aprendizagem, sempre em companhia) a formadora faz uma surpresa, coloca um projetor (antigo) e começa a passar slides, tirados em 1978, num jardim de infância de Lisboa.
Eis que me vejo, entre meninos e com eles, a preparar um "projeto" (sim estre aspas, nessa altura pouco se falava disso) para comemorar o dia da criança, em conjunto e para os meninos da primária, de uma escola vizinha. Entre o espanto e a emoção, fiquei para ali a olhar, concentrada nas imagens de meninos e meninas que hoje têm mais de 30 anos e que à minha frente, se revelavam a fazer coisas...combinar e escrever o que gostariam de fazer: teatro, bolinhos, uma corrida...foi necessário escrever os números e decorá-los para colocar na camisolas, colocá-los por ordem no placar, bater a farinha e o acúçar, colocar os bolinhos nas formas, inventar a história para o teatro, distribuir as personagens, abraçar uma menina mais "irrequieta", dar tempo aquela que chegava sempre tarde (os pais eram atores, eu compreendia e recordei o ar teatral desta minha menina, que chegou a ir ao jardim zoológico com um vestido até aos pés).
Apesar de não me lembrar de tudo (será que esqueci o essencial?) com as imagens, alguns nomes de meninos romperam em mim, de repente e lembrei-me de muitos deles, desse tempo e de um certo fazer pedagógico...e espantei-me e emocionei-me e calei-me. A formadora (a mesma que em 1978 me inundou a sala com uma máquina, apoio e muito saber), fez a narrativa, com uma memória absoluta, que avivou a minha e o processo de trabalho. Para além dos produtos (e sim eles estavam ali, podiam ser vistos) o como e o porquê fundamentais na pedagogia
E recordei este início de profissão, a força que punhamos em tudo o que fazíamos, a descoberta de ser educadora na rede publica, acabadinha de ser criada, com gente como eu, acabadinha de vir da escola de formação. Valeu-nos o sonho, a procura, o investimento, o desejo de saber mais e melhor. E valeu-nos, na altura, este apoio de educadoras experientes que com entusiasmo, seguiam o que faziamos, apoiando, provocando, ensinando. Em supervisão.
O meu muito obrigada, Mili. Ah, e também por me ter visto tão jovem e tão novinha. Que saudades!
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