Depois de um fim de semana por terras de Aveiro, perto da memória da minha mãe e da infância, regresso à cidade e à escola. Parece que estive muito longe, tal foi a imersão no verde dos campos, no azul da ria e na cor branca das garças que povoavam a terra mesmo à frente da janela da minha casa. Um fim de semana meio tristonho, mas cheio de aconchego(s). Os de sempre, que moram connosco no lugar do coração.
Chegaram pela manhã, com risos, abraços e alguns amuos, que isto de começar o dia é diferente para cada um de nós. Mil conversas entre eles e elas, pulos e saltos, caras paradas à espera que nos juntemos todos para planear o trabalho. Alguma confusão com quem fica ao lado de quem, negoceiam-se empréstimos de brinquedos e idas para as áreas, relembra-se o que ficou decidido na semana anterior, mas não ouvem, porque se instalam, com prazer, nas amizades já construídas e cimentadas ao longo deste pouco tempo de vida conjunta. Olho para eles e sinto-me dispensável, tal é a alegria do reencontro entre pares.
Fico em silêncio a pensar que já muito cresceram, ali, na sala, palco de tantas vidas, ações, desejos, medos e confortos. Relembro o inicio e as brigas, os choros, a mão e o pé levantados com uma facilidade tremenda. Ainda é assim, mas com muito menos frequência. Agora, já aprenderam a usar as palavras em vez da impetuosidade do corpo sempre pronto para avançar sem olhar. Ainda assim é com alguns, mas aos poucos uma corrente de novas maneiras de ser com os outros vai tomando lugar e a dianteira e ouve-se com frequência: Manela, eu partilhei...eu trabalhei em equipa...e mostram as construções feitas a quatro ou a seis mãos, e pedem desculpa...e abraçam-se e apoiam-se e desenham a pares e pedem ajuda. E conversam.
E eu, olho e emociono-me. Gente pequena a aprender a ser gente, uma educadora a aprender a ser o melhor que puder ser, numa sala que já vai sendo património e lugar de todos. Ainda e sempre com diferentes níveis de inclusão e participação. Porque isto de pertencer a uma comunidade de meninos e meninas com adultos, é coisa muito difícil de alcançar. Pelo menos por estas bandas...mas para inicio de semana, não está nada mal. Eu corrijo. Está até muito bem, porque algumas palavras - mágicas - começam a ganhar terreno e raízes e a dar frutos. partilhar, ajudar, trabalhar em equipa, pedir desculpa...Sem falsos moralismos ou apelos normativos, mas como soluções e estratégias para uma convivência harmoniosa e respeitadora de todos e de cada um. Como alavanca para a construção da democracia na escola.
Com gente tão pequena? sim, com gente tão pequena e tão capaz. Por isso é que podemos e devemos usar e abusar das palavras que permitem, ainda que lentamente, mudar as atitudes e os comportamentos das crianças. Para que sejam mais felizes e atentas ao mundo e aos outros.
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