Penso nas reservas que tenho dentro de mim e agradeço. Permitem-me, em muitos dias, descansar no mundo, aconchegada e atenta. Porque as reservas nos protegem do desconsolo e da estranheza da solidão. Com elas, somos quem somos e somos muito(s).
Tenho reservas de amor dentro de mim, quem as não tem? existem no fundo de nós, quase sempre prontas para momentos de aflição e nostalgia. Os dias virados do avesso, compridos e com tédio, ou rápidos que nem uma gazela, incapazes de reterem a preciosidade da vida. Os dias inúteis, com desperdícios a mais e essência a menos.
Temos reservas dentro de nós. Pequenas coleções de alegrias, beijos doces, palavras mestras que nos norteiam, afagos leves e ainda assim, fundadores. Dias de chuva e de sol, cheiros de infância, risos e histórias, saudades e memórias, segredos e convicções. Tudo numa amálgama própria e certa. As reservas nunca se acabam e permitem retomar o fio da meada, quando as linhas se emaranham e sufocam os pontos principais da nossa geografia.
As reservas foram-nos dadas e depois construídas. Não há reservas sem um trabalho de nós, por nós. Cultivar o que foi luz e revelação, guardar abraços quentes, entender gestos delicados, percecionar a cultura de que fomos feitos. O pão, o vinho, o amor e as palavras com que nos banharam ao nascer e ainda moram em nós.
As reservas, para nos alimentarem, precisam de um trabalho miudinho...e paciente. Retirar, com minúcia, as ervas daninhas e eleger o que de melhor podemos ter nas reservas do que somos: um campo imenso de liberdade, um olhar de amor para o mundo, a crença na insustentável leveza do nosso ser. E também na sua determinação e inteireza.
Temos reservas dentro de nós. Vamos cultivá-las?
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