domingo, 19 de maio de 2013

Palavras emprestadas: uma conversa de almofada

Há dias assim.
Sentimos vontade de limpar a vida, retirar-lhe os pedaços inuteis, o que não vale a pena, as ervas daninhas. Um desejo de campo limpo, com trilhos marcados, numa rota direta ao essencial. Sem mais porquê ou para quê. Para que não nos confundamos, alheados e perdidos, em pequenas coisas de nada, que aniquilam os sonhos e a ternura que guardamos no lado esquerdo do peito.
Nestes dias, ao chegar à noite, cansados, procuramos poemas e pedimos palavras emprestadas a outros que disseram, de forma completa, o que andámos a remoer de nós para nós.

Assim:

Revoltavas-te, as tuas costas dobradas,
inclinadas para a frente, os seios tocando
nas pernas enquanto procuravas uma meia
debaixo da cama e franzias as sobrancelhas
numa cara de criança que acorda tarde:
"não percebo porque é que a poesia
tem de ser tão absurda". E eu respondia-te 
que tem de ser assim, porque o mundo
já está cheio de coisas concretas e práticas
que não fazem sentido nenhum 

Pedro Tiago in Comportamento das Paisagens

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