quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Dias de verão

Hoje estou cheia de bocados de saudade e réstias de sol no cabelo, como quando corria nos campos da minha infância, pisando, estonteada, tufos de erva molhada e chapinhava, com força, os pés nus nos carreiros de água a deslizar veloz pelo aido. Sinto a falta da terra, do cheiro das sementes, do sol a bater na eira, da sombra do alpendre, das joaninhas e das abelhas que voavam velozes e davam ao verão um zumbido de tempo inteiro.
O tempo não terminava mais e nós, com os corações a bater de tanta correria e descoberta, a mandar o corpo para cima da palha das espigas. Sem medo, tanto pó no ar, nós a sacudir a roupa, com gestos rápidos e as faces coradas de tanta brincadeira e contentamento. Depois a serenar, corpo parado, alma atenta, olhos brilhantes, felizes. Em silêncio, quietos, com cara ainda de riso, a olhar para os grandes, a sondar da sua condescendência e permissividade.

Podemos? Podemos, estão distraídos e ocupados, ceifar o milho, secar a palha, regar a terra, apanhar as uvas, guardar os animais. Recomeçar, novas corridas e gargalhadas, brincar às escondidas, enxotar o gato que atrapalha a corrida, sai sai bichano, danado, não posso parar, já não ganho...e abraçar a árvore, para descansar, por entre a algazarra e gritaria. Onde estão todos? já te vi, sai daí, assim não vale... 
Hoje estou cheia de bocados de saudades, imagens, lembranças, cheiros e coisas assim. Saudades de lugares e pessoas, o cheiro do café, as padas grandes com manteiga, o copo de vinho na mesa da cozinha, a maceira da carne,  o andar da minha avó, o caminho para a ribeira, a venda das nabiças na feira do largo da igreja. E o ceú azul, muito azul. E a eternidade da vida. Assim pensava eu, quando ouvia o cantar dos grilos e o coaxar das rãs junto ao moliço, na beira da ria.

Nunca mais vivi dias assim. Lentos, quentes e preguiçosos. A saber a amoras, ameixas vermelhas e uvas amaricanas, como dizia o meu avô. Ácidas e doces a desfazerem-se na boca. Tenho saudades disso.    


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