sábado, 17 de dezembro de 2016

Natal

Penso nas escolas e penso na infância. Em algumas, pois, que escolas há muitas e infâncias, também. Penso e respiro. Penso nas infâncias mais difíceis, aquelas que me perturbam e me retiram a esperança nos homens. Penso e inquieto-me com a vida e a roleta da sorte. Penso no destino e nas escolhas. Penso que não há solução à vista para abrandar a indignação. Penso na pobreza, nas crianças à procura de abraços e na enorme desvantagem de não ter como aquecer o corpo e os sonhos.

Penso nas escolas, nas salas de aula, nas mesas e cadeiras, nas letras e números suspensos no quadro preto, coisas estranhas de aprender, funcionalidades curtas e sem sentido para o dia que cresce e vai anoitecer sempre igual, nos lugares mais escondidos da vida e do tempo dos meninos e meninas da escola.

Resultado de imagem para imagens arte naif natalPenso neles, nos seus risos e movimentos, nas birras e brigas, nos gritos, protestos desordenados de mau estar e inquietação, consciência aflita dos direitos não cumpridos. Penso neles e no que sentem sobre a desigualdade, expressa nos cuidados e aconchegos que não têm. Penso na radicalidade de chamar as coisas pelo nome, porque vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar.  

Penso nos professores e na dificuldade de escapar aos contornos e rasteiras do contexto, impor-lhe trâmites e limites, desafiar os seus efeitos perversos. Penso nos professores como arautos da mudança, fazer de novo e sem inércia, combater os medos e propor a alegria. Penso na possibilidade imensa dos seus afetos, do bem querer e do cuidar, coisa primeira para a relação, lastro certo para definir o prazer de aprender. Antes, durante e depois das letras e dos números. E para além dos rankings. 

Penso nisto tudo, neste natal. No cheiro dos doces e nas lareiras acesas e nos meninos que não têm direito a estar à volta da fogueira, em colos bons, mesas fartas e brinquedos desejados. Penso nisto, nas escolas e nos meninos e envergonho-me do nosso conformismo, da nossa indiferença e da nossa desistência.
Penso nisto e na nossa (eventual) impotência. Fazer o quê? se mais não for, nunca desistir. Continuar, fazer o que nos é devido, como o colibri, que combateu o fogo na floresta com bocadinhos de água que levava no bico e que, face à estranheza do elefante por reparar na pequenez da ajuda, lhe respondeu faço a minha parte. Façamos também a nossa. 

8 comentários:

  1. Como habitualmente : gostei muito.

    Nota : tentei partilhar no Facebook a da semana e não consegui.

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  2. também eu e não consegui...mas como não percebo muito disto...um bom natal! e obrigada

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  3. Manuela Matos, gostei muito de te ler. Continuação de sucessos pessoais e uma excelente época de encontros familiares e amistosos. Beijinho, Manuela Richtr

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    1. olá, Manela, obrigada pelo comentário. E bom natal para ti. Quente, doce e cheio de abraços

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  4. Olá Manela...finalmente te encontrei. Gostei...gostei de tudo! Grandes verdades! Faz-me pensar.
    Espero que esteja a correr tudo bem contigo. Um beijinho grande.
    Sandra Ferreira

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    1. olá, Sandra. Tudo bem contigo? e com o menino? abraços e bom natal

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  5. Texto magnífico! Adorei! Feliz Natal para si e para os seus.

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