desenho da Maria Rita |
Nesta ocupação permanente, falta-me olhar para o azevinho, sentir-lhe o cheiro e o verde pinho, acomodar-me junto à candeia acesa, procurar pequenos caminhos, húmidos e com musgo e figuras do presépio da infância. Os pastores e os reis magos e as lavadeiras, todos perfilados para ver o menino. Saborear o calor das lembranças, que nos trazem o sorriso da mãe, as meias que a avó punha no sapatinho, o sabor do arroz doce e das filhós. E sobretudo o colo, as vozes e o riso por perto dos nossos. Os de casa.
E uma espécie de pudor e culpa assola-nos, pela engrenagem consentida em que a vida se transforma, quase independente de nós, que somos a sua razão e a sua medida. Mas foge-nos o controlo, a insubmissão aos desígnios de um outro olhar, mais sensível, atento, capaz de inscrever a beleza nos dias do calendário que nos guia. Quem diz beleza, diz ternura, encanto, intimidade, alento.
O natal a chegar e eu com saudade de me recolher. Ficar por aqui, entre o sofá e a lareira, baloiçar-me num tempo lento, convocar afetos e lembranças, coisas pequenas, laços e fitas e alfazema, pérolas esquecidas no fundo das gavetas e no entanto, capazes de mostrar os pontos cardeais da nossa vida. Porque o natal também pode ser essa promessa, unir de novo o que está separado, propondo outro tempo e outros caminhos. Nunca vistos em coragem.
E neste natal, não podendo estar todos à mesa, que não falte o tempo para nos convocarmos por inteiro, rodeados por todos aqueles que no nosso coração e nos nossos dias, têm espaço e lugar cativo na nossa vida e no nosso coração.
Vamos lá abrir a porta ao natal. Cuidando de nós e dos outros. Mas com tempo e sem medo.
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