Não sabia que outra sorte havia de dar aos dias. Compunha-se diariamente para os cumprir ordeiramente e, no entanto, uma réstia de inquietação, ainda que mansa, destronava-lhe todas as intenções. Sorria com intimidade para os sonhos que a habitavam e alegrava-se com a sua persistência, ainda que ignorasse de onde provinham e porque vingavam. Não encontrava motivo para tanta permanência, e assim, quase com medo, discreta se queria e se perfilava, entre a sombra e a luz opaca. Evitava ser vista e percecionada, temendo perder-se entre os demais.
Desenho da M.(JI Trafaria) |
E estava só, inútil e parada, entre sonhos e palavras? não, cumpria com normalidade a função dos dias, sem que ninguém suspeitasse do fogo e da fúria para fazer outro tempo e outro lugar. Apenas alguns sabiam do seu desnorte, da sua resistência para entrar no carreiro, da sua paixão pelas margens e pela verdade. Esses poucos, que com ela partilharam o poder das palavras e dos sonhos, estimavam-na e compreendiam. E às vezes, em alguns dias de anunciação, compunham, em companhia, as mais belas lições de amor, esperança e rebeldia. E isso bastava.
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