terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Recato e pensamento.

Refugio-me no meu coração, que o tempo é de recato. Chove lá fora e a casa quente diz-me que tenho sorte. Alguns dirão que é justo, que a ela tenho direito, porque trabalhei a vida inteira. Pois sim, mas outros também o fizeram e casa não têm.  Não sei resolver esta equação, mas sei-lhe o sentido e a injustiça. Hoje permito-me não pensar nisto, apesar do frio.

Refugio-me no meu coração, para não me perder. Quero-me inteira e capaz de pensar, com a razão e a emoção. Dá trabalho esta conjugação, acertar os pesos da balança, que de instável, pende, às vezes, para uns dos lados. E poucas coisas são binárias, ainda que na nossa pequenez gostemos de arrumar a vida entre "isto ou aquilo". Não chega, face à dissonância do mundo.

ilustrações do natal - JI Trafaria
Refugio-me no meu coração e sou procura e consumação. Uma espécie de criança pequena espantada no tempo e com os homens que o habitam. Do lugar onde estou, o que vejo perturba e inquieta. Campeões de corridas, queremo-nos rápidos e invencíveis. A velocidade como meta, mesmo sem saber o caminho. E importa? Depende, não me sinto capaz de discutir cenários.

Refugio-me no meu coração e tento sossegar. Aquietar-lhe as razões e os desvarios, contê-lo, para que não se distraia com as luzes cintilantes da época. Reter apenas o essencial, nas noites frias do mês presente. Um agasalho, uma chávena de café, um pão quente, um abraço presente. Nós com os de casa e os da nossa vida, que são esses e outros. Quantos? Não importa, hoje não faço contar de somar, hoje as contas são de acertar.

Refugio-me no meu coração e acerto-me. Eu comigo, entre as vozes e as nozes, que o tempo é de natal e frutos secos, exige recato e contenção. Ser outra coisa, no meio do desatino e do comércio, ser essência e frugalidade, ser conduto na mesa e braseira para o frio. Suficiente? não sei, apenas me ensaio e me experimento, acertando duvidas e certezas, querendo-me inteira e a pensar. Para não me perder, neste natal. Por mim e pelos outros.

   

1 comentário:

  1. Olá Manuela o quanto me marcou as suas palavras na formação que deu no colégio Cesário Verde com a sua essência e penso em si, a fazer o que faz, na terra do meu coração e o quanto eu não dava poder usufruir dessa terra desprezada por tantos mas que para mim, é um refúgio, é um pequeno paraíso. Beijinho e continue a brindar-nos com os seus textos.

    ResponderEliminar