Fui matar saudades e contar histórias a meninas e meninos. Que bem soube vê-los de perto, ler e conversar e abraçar. E vim para casa cheia de palavras, a ruminar ideias e convicções. A pensar na grandeza desta gente pequena, que fala com sabedoria e autenticidade dos seus cinco e seis anos de idade.
E no meio das histórias - vai ser grande? não gosto de histórias grandes... - conversas do tamanho do mundo e da vida. A propósito das minhas apreciações sobre a documentação exposta, as ideias surgem em catadupa. Todos querem falar e todos têm ideias.
- Mas afinal como fizeram o que estou a ver? como se organizam? quem é que decide o que se faz e como?
E eis que dizem, sem pedir licença:
- Nós aqui temos liberdade, escolhemos o que queremos fazer...
- Por exemplo, eu sou a presidente - não sou, mas é para explicar - eu digo a alguns meninos para eles fazerem as tarefas, darem o leite, ou assim...
- Quer dizer, nós escolhemos e a professora também...
- E o que acham disso?
- Acho bem, escolhem os meninos e a professora... (muita concordância)
- Mas às vezes temos que mudar...porque precisamos de aproveitar as áreas...
- E isso é o quê? aproveitar as áreas?
- É poder aprender em cada área coisas diferentes...aproveitar as coisas...
- Então, às vezes conversam com a professora, avaliam e conversam sobre a mudança de áreas...
- Sim, mas eu acho que não há liberdade, disse outro menino
- E porquê?
- Porque não há liberdade total...
- E a liberdade total é o quê?
- Em casa eu tenho. Liberdade total, posso fazer tudo... o meu pai também tem, liberdade total, porque fica todo o tempo na cama...
- E o teu pai faz sempre o que quer? não tem obrigações, coisas que tem que fazer mesmo sem querer? só faz o que quer?
- Sim, ele é o patrão... (e contou 5 vezes o meu pai é livre...)
. Pois, mas eu parece-me que ele não faz apenas o que quer...porque acho que as pessoas fazem as coisas que querem, mas em muitas delas, têm que também pensar nos outros...aqui na sala, por exemplo, têm que combinar uns com os outros... porque vivem em conjunto
- Mas em minha casa eu sou livre total...
- Podes fazer tudo em tua casa? podes ficar uma noite sem dormir, tudo, tudo...?
- Pois, eu acho que livre total só são os animais, rematou a M.
E continuámos por aí fora, a esgrimir ideias e conceitos, dedos no ar (o M. avisou-me que tínhamos que por o dedo no ar... ) e conversa pronta, decorrente das vivências na sala e em casa, que assim se fazem os meninos e as meninas, que pensam sobre o que lhes acontece e que se apresentam, competentes e interessados em conversar sobre a vida, as relações, o poder, a liberdade.
Depois foram abraços e despedidas e combinações para uma outra vez. Ficou prometido. Depois no carro, eu a pensar que os meninos e as meninas nos dão tantos conteúdos curriculares significativos, e nós (e eu) perdidas, a procurar os conteúdos do currículo fora deles. E nós a pensar e a atestar que eles são imaturos. E nós a enchê-los de "ainda não". E eles a mostrarem-nos que "já, sim". Já pensam, já sabem e já expressam. Necessitam, e a isso têm direito, de adultos que os ouçam e os desafiem. fazendo paragens no currículo, ou reequacionando as suas prioridades e sentidos. Para isso necessitamos de os sentir e querer gente capaz e com direitos.
Vamos discutir (mais vezes) sobre liberdade... total?
Que reflexão tão mas tão livre! Total? A mim fez-me sentir mais livre porque me inquietou! Obrigada!
ResponderEliminarMuito bom
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