A água a bater forte contra a areia e a mulher a interrogar-se sobre o vai e vem da vida, a sua e a de outros. As gotas salpicadas um pouco por todo o lado, a fazer vingar a ideia da liberdade do verão. Uma liberdade gostosa e hoje, afinal, coisa pouca. Porque os tempos são ditados pelos estados de alma e pode ser inverno em pleno verão. Pois pode.
E era assim que estava surpreendida com o correr dos dias menos ditosos. Sabia, pela idade que tinha, que as promessas não são como os frutos maduros que se apanham em tempo certo. Existe a probabilidade de se arrancar da árvore a maça ainda verde, mesmo que se saiba de cor o ciclo da vida. Os homens são capazes de gestos descabidos e contranatura. Crescem com amarras no corpo e nos sonhos, levam a vida toda para desembaraçar inercias e alcançar asas nos pés.
Olhou de novo o mar e abeirou-se da tristeza. Um instante apenas, num laivo de desencanto. Depois reagiu e aprumou-se. Não ia de bem consigo eternizar a nostalgia da água a espraiar-se, sem rumo. Se já tinha movido montanhas em dias de vento norte e tempo seco, como deter-se agora, face à serena imensidão do mar?
Levantou-se e sacudiu a areia e o desalento. Esperaria pelo cair da noite e a renovação do dia, na convicção de mudar as lentes de ver o mundo.
Apesar das rugas acontecia-lhe, não raras vezes, inventar-se com a certeza da juventude.
Mas isso era segredo e não dizia a ninguém, não gostava de risos disfarçados em rostos condescendentes.
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