Estamos bem e assim queremos continuar. Apesar do receio, somos do grupo dos protegidos, desses que a sorte reclamou para si desde que nascemos ou quase, num caminho regular. Temos trabalho, casa, informação, lemos, pensamos e opinamos. Vezes sem conta, a propósito e a despropósito. Com otimismo, somos os primeiros a postar que vai ficar tudo bem. Talvez, mas não para todos. E nós sabemos, ainda que sem sempre o digamos. Quem gosta de revelar a verdade nua e crua?
Somos do grupo dos protegidos. Do covid? não, das coisas injustas e madrastas da vida. Não precisamos de andar de transportes, não vivemos em guetos, não sobra mês no fim do ordenado, conseguimos mais do que um pé de meia e mudamos os móveis de quando em vez. E compramos livros. E lemos. Não podemos ignorar, como nos disse a poetisa.
Somos do grupo dos protegidos. Tivemos sorte e
educação, os nossos filhos são inteligentes, rapazes e raparigas aprumadas e
simpáticas, que estão nas turmas certas. Porque os outros, os inoportunos, os
sem sorte ou mal-nascidos, estão nas erradas, aquelas que ninguém quer. E
atrasam os que sabem. E se atrasam os que sabem, o melhor é ficarem todos
juntos. Parece que ainda há disto, por aí. Apesar do decreto da inclusão. Porque decretos são
decretos e às vezes a pedagogia fica na gaveta. A realidade é dura e esquecemos-nos.
imagem do livro "D. Miquelina, o seu filho e a professora"(Sara Monteiro; Catarina Marques; Ambar)
Somos do grupo dos protegidos. E não há mal em assim ser, não seja esta proteção sinónimo de vistas curtas. Porque o mundo não é todo igual e podemos dar como certa aquela que é a nossa condição. Como se todos assim vivessem. E não vivem, não é? Se andávamos distraídos, a pandemia mostrou o outro lado da vida de muitos meninos e meninas, como na história da Maria dos Olhos Grandes e do Zé Pimpão. Há quanto tempo não lemos as histórias certas?
E agora que vamos voltar à escola, impõem-se planos de contingência e cuidados acrescidos. E neste limbo de contenção com os outros, temos que ser arrojados e saber proteger os mais desprotegidos. Na saúde? sim, claro. Mas sobretudo nos afetos, no cuidado e na atenção. Porque as vidas não são todas iguais e há grupos pouco protegidos do vírus, da desigualdade, do insucesso.
Nada de vistas curtas. Vemos ouvimos e lemos, não podemos ignorar.
Cada vez mais temos de filtrar o olhar e ver para além das aparências. Os meninos malcriados, que incomodam e perturbam, são os que precisam de colo e de um coração aberto para os acolher. Assim possamos ter o olhar educado e sensível para quem precisa mais de nós. Preciso de te ler para poder partilhar o que sinto através das tuas palavras. Obrigada Manela, gosto muito de ti!!!
ResponderEliminarConcordo plenamente com o texto. Olhemos para as nossas crianças com um olhar mais profundo, para além do que nos mostram. Aninhemos todos e aqueles que mais precisam.Beijinhos
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