sábado, 26 de abril de 2014

Fuga

Certificou-se de que a casa estava bem fechada e que podia partir sem que os tesouros guardados ficassem a descoberto. Deixou as portadas das janelas entreabertas, um pouco de sol e luz seria bom para anunciar o romper dos dias e o cair da noite, ainda que ninguém no interior da casa  por isso esperasse. Arrumou com cuidado o ultimo livro lido, regou os amores perfeitos do fundo da escada, guardou a chaleira do chá no armário de faia, alisou as ervas de tilia e camomila que pendiam na parede forrada da dispensa. E colocou em cada gaveta, sacos de alfazema, bordados a ponto cruz, oferta da avó em tempo de primavera. Olhou de novo as fotografias espalhadas pela casa, a confirmar que o lugar de cada uma não tinha sido alterado. Gostava do sentido da ordem que inventara, em noites de recordar amores vividos. Tudo perfeito.
 
Menos perfeito e em ordem era a vontade que se instalara no corpo e na alma, de partir. E no entanto nunca se tinha arredado de casa e dos seus, a não ser os poucos metros que separavam a porta da casa do fim do caminho que conduzia até ao portão. Apenas nesse percurso se ausentara de todos, em tardes de tempo quente, com cheiro a feno, quando os dias se começavam a alongar e entravam, sem pedir licença, pelas noites dentro. Com a chegada do  escuro obrigava-se a regressar, mulher de lida de casa por fora, forasteira de correr mundo, por dentro. Só ela sabia como se equilibrava nesta balança demasiado sensivel a pesos e medidas não padronizados.

Um sofrimento, quando outros inquiriam destinos no feminino. A todos ouviu e obedeceu, até ao momento em que o sono fugira e em seu lugar se sentou, noite após noite, o desejo de partir. Sem dar descanso ou permitir distrações, eram-lhe oferecidas as imagens mais belas de terras não conhecidas, envoltas em madressilvas e amoras vermelhas, campos de trigo, salpicados de papoilas e crianças a correr. Tentou, sem sucesso, filtrar outros contornos e espaços, aqueles que sempre estão por detrás da beleza da paisagem, mas nunca avistou nada de imperfeito que a fizesse desistir de tamanha loucura.

E assim estava à porta de casa, a olhá-la de alto a baixo, a guardar toda a sua beleza, solidez e longevidade. Casa forte, segura e conhecida, nela nasceu, fez-se menina e moça, jovem e mulher adulta. Nunca a casa se tinha revelado muro ou janela fechada. Apenas agora, numa inexplicável rebelião contra o instituído, se apoderara dos seus limites e das suas amarras. Cortá-las era uma dor enorme, mantê-las uma condenação perpétua.
Não se queria condenada e por isso, partiu. Não olhou para trás e levou uma eternidade para chegar ao fim do caminho e abrir o portão.

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Cumprir o 25 de abril

Muito sol e claridade, neste 25 de abril. Ainda bem, 40 anos não são para deitar fora ou ignorar. Não podemos esquecer os rapazes dos tanques, nem o grito do povo nas ruas, nem o 1º de maio de 1974. 
Não podemos esquecer a clausura de tantos homens e mulheres que lutaram pela liberdade. Não podemos esquecer as nossas conquistas e os nossos direitos, simples e claros, a paz, o pão, habitação, saúde, educação. Há 40 anos, como hoje, a luta para que se cumpra abril, de verdade e sem medo. 

Por isso, começar pelos mais novos, os que ainda não estavam cá, é um compromisso e uma ética, em tempo de abril.  Na escola, com os meninos e as meninas, vimos a história dos Barrigas e dos Magriços, lemos o Tesouro do Manuel Pina, pintámos cravos de muitas formas e tamanhos, fizemos uma caça às letras para compor a palavra liberdade, observámos as fotos do livro os rapazes dos tanques. E conversámos. 
E os meninos e as meninas, no meio de perguntas, brincadeiras, olhos muito abertos, gostaram da palavra de ordem o povo unido jamais será vencido. Repetiram-na a correr, pelo recreio, a rir.

Apesar de pequenos, das distrações e de tantas coisas estranhas que não ouviram, porque não podem compreender, os meninos e meninas da escola ficaram contentes e alegres, sentiram a festa e a alegria. Porque cantámos e dançámos o que eles sabem e lhes pertence: mornas, cu duro, capoeira, danças ciganas...também ballet, rap, wings.

E foi por isto que se fez o 25 de abril. Para devolver a todos e a cada um a liberdade de nos podermos dizer, sem medo da nossa identidade, das nossas origens e do nosso futuro. 
Para que todos os homens e mulheres, tenham direito a ter, para além do pão, a cultura, os sonhos e a dignidade. 

Para se cumpra o 25 de abril. Para que nunca o esqueçamos.

domingo, 20 de abril de 2014

Dia de Páscoa

De volta ao meu aconchego, como diz a canção, estou de novo em casa. Respito fundo. Aqui estão quase todas as coisas que me pertencem e me constituem. Apesar de gostar muito de viajar, gosto do cheiro do meu lugar, do meu canto, do meu indispensável espaço fisico e emocional. 

E hoje é domingo de Páscoa. Para além do jornal, comprei flores, tulipas, depois compu-las com verdes do jardim e alindei a sala. O folar também está na mesa, depois do almoço de borrego e de uma belissima salada de frutas. Desta salada que todos apreciam, uma jovem espanhola que um dia cá veio a casa disse mui rica. E é assim que ela está, colorida, gostosa e mui rica. Também há amêndoas, de chocolate e canela e dois coelhos lindos de chocolate que uma amiga me deu. E uns sonhos, ainda quentes, que uma outra amiga me deu, quando passei há pouco lá por casa, para lhe dar um abraço. Amigas do coração, grandes e importantes na minha vida. Tesouros absolutos, árvores grandiosas com muita sombra, onde posso descansar e temperar forças, sempre que o sol aperta e não há água que sacie a sede. Elas estão lá e dão-me sempre um jarro de água fresquinha. Nada a temer, portanto, nas longas jornadas que de vez em quando teimo em empreender.
Tulipas flor vermelha com ovos de Páscoa
Assim calma e alindada, doce e florida, a casa parece dormir, e é domingo de páscoa. Falta o cortejo do padre, quando eu era pequena, que na minha aldeia, se deslocava de casa em casa, a dar a boa nova da ressureição. Eu gostava desse dia e desse ritual, a campainha a anunciar a chegada, as casas muito arrumadas e bonitas, a porta da casa do senhor aberta, para bem receber. 

E a garotada de olhos nas amêndoas de dia de festa, iguaria de luxo anual a não perder. E prenda dos padrinhos que era quase sempre uma regueifa grande e uma nota, para o mealheiro. E o som dos sinos da igreja a tocar muito alto, em tom de alegria e ressureição. Parecia que tudo ficava vestido de novo.

Hoje o dia vestiu-se de cinzento, não se ouvem os sinos, não temos o cortejo, já não somos crianças, e os padrinhos também já partiram há muito. Por isso fui comprar flores e alindei a casa e a mesa e pus a tocar o Messias de Handel e ouvi a faixa Aleluia. Para sentir o cheiro da Páscoa e a alegria da renovação da vida. 

Em Abril, como prelúdio para a comemoração do dia da liberdade, que vai ser nesta semana e que já faz 40 anos. Semana cheia.
 

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Apontamentos de uma cidade bela

No meio de bicicletas e motas, ruas com arcos e cafés bonitos, sobriamente decorados, fachadas com portadas e varandas de ferro forjado, percorro a pé avenidas e ruelas, praças e jardins, observo tudo o que se apresenta aos meus olhos e ao meu coração. Há um contentamento em mim, porque é bonito o que vejo, uma cidade em tons de laranja, castanhos e cor de terra, uma cidade antiga, cheia de história, vestigios, força, presença e gente.

Passam por nós a a falar, estão no seu lugar, os estrangeiros somos nós a admirar a limpeza das ruas, as flores nas janelas, os candeeiros nos arcos, as montras com dezenas de formas de chocolates e ovos da páscoa, esteticamente arrumados e colocados uns ao lado de outros.

Também há flores, muitas e mulheres que as levam, algumas na bicicleta em que se deslocam, soberbamente bem vestidas, no seu meio de transporte habitual e que não é um BMW.

Bolonha Cafe ViagemTambém há uma livraria e muitos livros para a infância. Belissimos. Demorei-me nela mais do que uma hora, perdi-me a ver, a tocar, a surpreender-me, mais uma vez, com a criatividade de alguns homens e mulheres do nosso tempo, capazes de perfeitas obras primas, através de palavras e ilustrações soberbas. 

Apesar do dinheiro ser pouco, não resisti, comprei dois. Dificil, mesmo, foi escolher. Fiquei a pensar nos outros todos que deixei. Uma pena, porque os livros de qualidade para crianças são também para adultos. Queria-os todos - ou quase - para mim.

Também há o espaço - campus - da universidade, a primeira da Europa, a mais antiga, imponente mas quase (incompreensivelmente?) acolhedora, cuidada e quase familiar. Tudo com muito sentido estético e bonito, novamente, muito bonito. 

Sento-me num banco de uma praça, fecho os olhos e ouço o som da  fala das pessoas. Ainda que discretas, sinto a musicalidade da lingua e lembro-me de alguns filmes: O Carteiro da Pablo Neruda, A Melhor Juventude, O Cinema Paraíso, A Vida é Bela.

E agradeço ter podido vir até aqui , nestes dias de páscoa.

domingo, 13 de abril de 2014

Domingo(s) com arroz doce

Domingo. Lembro-me da minha avó, da ida à missa e da volta pela praça, da broa quente e do cheiro a café, das roupas domingueiras e dos bons dias alegres que dávamos entre todos, porque o domigo era um dia diferente, mais livre, sem o trabalho e as obrigações da semana. Às vezes a aletria e o arroz doce tinham lugar de destaque à mesa e isso era muito bom. Doce.

Quando cresci e me vi na minha vida, mulher jovem e independente, com a revolução de costumes na cabeça e no propósito, quase fiz tábua rasa deste ritual, para marcar a postura de que domingo é quando um homem quiser e assim, deitar fora sem deitar, o tradicionalismo e o mofo pressentido nestas práticas. 

Quando fui mãe, com os crescimento dos rapazes, os domingos viraram tempo de descanso, brincadeiras no parque, piqueniques na mata dos medos, ida aos jogos de andebol para apoiar a equipa, durante muitos anos. Apesar disto, o descanso nunca mais foi aquele da infância, porque a profissão sempre foi rainha nesta casa. Um modo de estar no mundo e na vida. O domingo para fazer mil e umas coisas, relatórios, trabalhos da licenciatura, investigação do mestrado, teses de doutoramento.

Hoje que os rapazes já voam com frequência para fora do ninho, fico-me para aqui a pensar na vontade de fazer arroz doce e um folar, pôr a mesa mais linda que souber, beber o café na mesa e demorar nas conversas. E tê-los ao pé de mim, a rir, homens feitos de um tempo apressado, mas disponiveis e atentos, sensiveis.

E reclamo domingos com rituais, para nos enlaçarmos um pouco mais, que a vida é fugidia, esgotante e instável e precisamos de temperar, com mestria, o sal e o mel dos dias.

Continuo a pensar que as coisas, quase todas as coisas, são quando um homem quiser, porque a liberdade de nos construirmos e nos dizermos não deve obedecer a um figurino único. Mas estou hoje mais convicta e mais segura de que o tradicional não fere, por si só, a inovação, nem a autenticidade, nem o progresso. E que isso só depende de cada um. 

Saudade? velhice? maturidade? Tudo junto, talvez, e a vontade de comer arroz doce junto dos que amo, aos domingos. Com tempo.

sábado, 12 de abril de 2014

Tempo pleno

Manhã cedo. Sábado. 
Saí de casa como sempre, para comprar o jornal e tomar café. Eterno ritual que me pacifica e me ajuda a respirar. Uma ligeira neblina cobre o dia, fresco e tranquilo. Percorro as ruas silenciosas, deambulo pelos meus pensamentos, faço listas de memórias e saudades bonitas. 
É abril, vai ser páscoa e os ovos de chocolate e as amêndoas piscam-nos os olhos em tentações doces. O verão aproxima-se a passos largos, o tempo corre ligeiro sem perdir licença e nós que do relógio muitas vezes somos escravos, ficamos surpreendidos com tanta velocidade. Não o conseguimos deter. 
E às vezes era necessário. Sentarmo-nos de baixo de uma árvore, descansar os olhos numa paisagem, abrir um livro e ler um poema.
Isso já fiz hoje.

Ausência                                                        
 
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
pessoasE lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
Carlos Drummond de Andrade, in 'O Corpo'

Este sábado está assim. Livre de obrigações e pleno de tempo. Para nos enchermos de nós. Plenamente.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Para além das palavras

Desde cedo me deslumbrei pelas palavras, ditas, escritas, inventadas. Um paixão assumida, ainda que discretamente, um pouco a medo, na intimidade do meu tempo e dos meus sonhos. As palavras a namorarem-me de mansinho, a acertarem com os estados de alma, às vezes a sairem em correntes de água brava, loucas de fúria, outros dias a transformarem-se em mantos calmos de lagoas esquecidas. As palavras desde a infância, companheiras de solidão na juventude, suporte de mimo no nascer dos filhos, rede de entendimento na maturidade dos anos. As palavras como continuidade e rasto de corpo, pensamento e emoção.   

As palavras dentro dos livros que outros escreveram, eu a procurá-las, a esbarrar nelas com surpresa e encantamento, sentir-lhes a beleza e a identidade.
Eu quase morta de espanto, por outros saberem colocar em linha as ideias mais claras, felizes e belas, autónomas e autênticas. Eu a pensar nesta forma de arte, que compõe e alisa, renova e oferece, perdura, liberta e enlaça.
Eu a ler títulos de obras e a ficar emocionada com a inteligência, a criatividade, o engenho, a quase perfeição.
Eu a espreitar livros e a desbravar mistérios, a perder-me noutros mundos, a vestir-me de novas paisagens. Eu a olhar pela janela e a querer correr mundo, escrever um livro, relatar vidas, prosseguir metáforas. Belas, como as do carteiro de Pablo Neruda. 

E no entanto, nunca o fiz. Nunca fui capaz de escrever um livro, ainda que de bolso e edição caseira, sem pretenções, nem escaparates. Escrever um livro, fazer-me escritora, ainda que pequena, ainda que apenas por uma vez, apenas para mim. Para dar forma a este sonho e a esta consumição de tanto querer e tanto amar.

Mas eu sei que não chega gostar de palavras e delas fazer manto, mesa e pão. Não chega gostar de escrever e vigiar a chegada da inspiração, para apanhar a onda e escorregar nas ideias até morrer na praia. 

É preciso, de certeza, uma dose imensa de trabalho, inquietação, persistência, silêncio, concentração no propósito. E talento, muito talento.
 Não tenho reunidas em mim, a maior parte destas qualidades. E tenho pena. Gosto tanto de palavras, gosto tanto de escrever. Mas um livro, não sei fazer.              

terça-feira, 8 de abril de 2014

Como sempre

A minha amiga fez anos. Mais um.  E como sempre não disse nada a ninguém. Como sempre muitos amigos telefonaram e alguns apareceram para um café. E risos de amizade antiga e incondicional.

A minha amiga não é jovem, mas tem um ar decidido e frontal e uma cabeça de gente que olha o mundo para lhe conhecer os truques e as novidades. A minha amiga, apesar de às vezes se virar para dentro, gosta de olhar para fora, para os lugares onde a vida acontece, com mistérios e enredos. A minha amiga conhece da vida os seus sabores mais exóticos e menos comuns, que viu e absorveu em paisagens, amores, livros e sonhos . A minha amiga podia ser estrangeira, tem ar de cidadã do mundo, pelas viagens que enceta sempre que a coração lhe pede liberdade e lonjura. De caminhos e encontros.

A minha amiga tem a arte de bem acolher e bem cuidar, estende a toalha da mesa e compõe vezes sem conta as chávenas do chá e a taça dos bombons que oferece nas tardes de conversa amena. A minha amiga dá-nos o seu melhor sofá e ajeita a posição da almofada, para que possamos descansar das aflições dos dias.

A minha amiga demora-se nas coisas que faz, livros que afaga, sopas que inventa, arrumações de mala de mulher distraída, pentear-se e pôr creme pela manhã. A minha amiga esquece-se das horas e do tempo e de outras coisas sem importância, mas não se esquece dos amigos. E nós não nos esquecemos dela.

Por isso, a minha amiga fez anos e nós fomos atrás dela e demos-lhe risos e abraços. E comemos um doce na casa dela. E ela deu-nos o seu melhor sofá e mandou-nos descansar. Como sempre.

sábado, 5 de abril de 2014

Retrato

No meio da arrumação, eis que descubro, numa prateleira mais escondida, um album de fotografias dos meus tempos de menina e moça. 21 anos e uma festa, lá para os lados da nossa terra. Muitas fotografias, todas com muitos sorrisos e felicidade, lembro-me.

No fim do album, meio esquecido, um retrato vosso, teu e da mãe, lindos e calmos, tu com o braço por cima do ombro dela, cabeça inclinada, sorriso meio nostálgico, ar de rapaz de 20 e tal anos. A mãe, de cabelo preto e ar doce, também a sorrir, entre a alegria e a saudade, parece. Por detrás, a paisagem vista da nossa casa, as árvores mesmo em frente da casa da vizinha, uma terra de milho pronto a debulhar, algumas flores brancas no nosso jardim. E a neblina. Sempre a neblina, o cartão de visita da nossa terra, quando o dia nasce pela madrugada e  as manhãs ficam frescas e cheias de um musgo húmido, salpicado de gotas de orvalho.

Fiquei cheia de alegria e saudade, a olhar para o vosso retrato. Tinha-me esquecido da cor do cabelo da mãe, assim nova e mulher de 50 anos. Da sua juventude, da sua pele e da sua beleza. Trigueira, como lá se diz. Cor do sol e da palha do milho. E tinha-me esquecido do teu ar de menino lindo e meio timido, sedutor e menineiro. Jovem e cheio de sonhos, discretos e um pouco escondidos, parece.

Olho para a fotografia e alegro-me, ainda que um pico de nostalgia me percorra o coração. Descubro de novo a nitidez dos afetos, em dois rostos de amor para sempre. Mano e mãe, num dia feliz.

E revejo-me, nesse dia, menina moça, com as certezas que possuia e uma fé inquieta para mudar o mundo. 
É bom começar assim um sábado cheia da vossa presença, amores da minha vida. 

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Telegrama em tempo de primavera

Andarás pelo tempo, leve como uma folha em dia de primavera, verde e nova, a rebentar em pequenas formas e cores, em cima de troncos quase perfeitos, assim o sentirás. Cumprirás o teu desejo lentamente, a apreciar o sabor da liberdade e dos sonhos, como se o presente só a ti pertencesse. 
Contente, olharás cada flor da rua mais bonita da cidade e sonharás de novo com o teu pleno amor, esse que escapa à compreensão das ideias mais certas dos homens em tempo de decisões sensatas. Não ouvirás a voz da razão, não conheces esse dialeto e não o queres de novo impregnado nas roupas antigas que ainda não deitaste fora. 
Não as queres, por mais que cheirem a históprias antigas que fazem sorrir e correrás a cobrir-te de um manto de luz, porque te sentes e sabes conhecedor de novas linguagens, essas que espreitam poderosas do fundo da tua alma errante.
Assim te lembro, enquando espreito o quintal cheio de flores que necessitam de ser cuidadas. 

Mas o tempo anda cheio de água das nuvens e não há paz nem sol que convide a uma tarde de jardinagem. Assim vão crescendo, sem que eu queira, ervas daninhas, silvas e urtigas que picam as mãos que tecem a ternura. 

Vou querer que o teu jardim se renove com força e circunstância, aquela que permite que brotem da terra as cores mais vivas da primavera, em forma de tufos de malmequeres, catos e amores perfeitos. Estes ultimos nem sempre resistem e crescem viçosos, mas acho que no lugar onde estás a terra parece forte, com jeito de mulher em tempo de gestação. 

Como sempre, espero que não te esqueças dos utensilios para cavar a terra e alindar os canteiros. A natureza, apesar de bela e promissora, não escapa às intempéries que muitas vezes invadem o doce correr do tempo e da paisagem